Depois de dois anos, o delicado espetáculo "ROSA DE VIDRO" reestreia no Sesc Consolação. O tocante texto de JOÃO FÁBIO CABRAL (de "Delicadeza", "Flores Brancas" e "Tanto), cuja meticulosa e apaixonada pesquisa (com mesclas biográficas e ficcionais) sobre a vida do dramaturgo americano Tennessee Williams resultou em um peça surpreendente, composta por um refinamento poético, uma beleza sórdida e dolorida e uma construção cativante dos quatro personagens que se revelam - e se desdobram, assim como o cenário - em suas angústias, ressentimentos, solidões, desejos reprimidos e liberdades engasgadas.
A direção de arte de André Cortez cria uma cenografia de cores sóbrias e linhas simples. Uma casa de vidro, capacete de desespero da protagonista, cheia de objetos cristalinos reflete o sufoco e a tristeza daquele lar e a ponta de uma espécie de tapete faz as vezes do cachorro Jiggs, numa solução bonita. Um revestimento basal no chão do palco, em tecido que se revela, a cada cena, em uma nova textura e cor diferente. O figurino de Benê Calistro utiliza o mesmo tecido destes desdobramentos nas meias-calças de alguns personagens, causando impacto visual e organicidade do elenco com a ambientação.
A iluminação de Fábio Retti resgata emoções nostálgicas, fazendo o público viajar até os anos 40 e 50. Aline Meyer mostra competência na sonoplastia, ressuscitando discos de vinil de Marvin Gaye e a clássica "Once Upon a Summertime", na voz de Blossom Dearie. Utiliza também com adequação a versão pop de "Over the Rainbow", na voz do havaiano Israel Kamakawiwo.
O detalhista trabalho de direção de RUY CORTEZ faz com que olhares, gestos, palavras, trechos de canções, pedras atiradas num lago e densos silêncios sejam absorvidos pela plateia com entusiasmo, emoções diversas e lágrimas.
No elenco é difícil constatar quem está melhor.
A ascendente JULIA BOBROW (que este ano esteve tocante na premiada "Roberto Zucco") é o centro, a alma e o coração de "Rosa de Vidro". A atriz, com inteligência e intuição, soube construir Rose, uma jovem esquizofrênica, de maneira encantadora e exasperada, causando compaixão, admiração e exalando talento e poesia no palco.
GILDA NOMACCE interpreta a mãe egoísta e severa, de forma segura, intensa e algo tragicômica. Uma mulher às voltas com as convenções retrógradas de sua época e as imposições de seus instintos.
TALES PENTEADO é Tom (o nome verdadeiro de Tennessee Williams era Thomas), o jovem dramaturgo preenchido pelo amor infinito que sente pela irmã, as rusgas com a mãe, o lar sufocante, a vontade de "ouvir o mundo" e a homossexualidade entalada no armário. Uma grande força cênica e um registro maduro de atuação.
RICARDO GELLI é o amigo Jim, que inicialmente surge como um coadjuvante com poucas falas e de repente arrebata o público com a construção e o desenho de um personagem luminoso, que cativa através dos mínimos gestos.
"ROSA DE VIDRO" é um espetáculo de alma grandiosa. Terrível e humano.
Em cartaz no Sesc Consolação. Quintas e Sextas às 21h. Até 25 de Fevereiro.
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